Tahar Ben Jelloun | O Escrivão Público



"P.S.: «Todas as verdades estão contra nós»; a esperança também. Então nada há a retirar daí. Podes fazer o favor de colocar em evidência estas palavras: «Molha a pena na tinta da minha alma e escreve!»"

"Eu estava ausente e não sabia. Afastava-me de mim mesmo sem dar conta. Partia em bicos de pés e instalava-me numa terra longínqua, numa açoteia de infância. Sofria já de amnésia de mim mesmo. Quanto mais a situação evoluía, mais eu perdia segurança e descobria as minhas fraquezas. Envolto num tecido fino e delicado, rodeara de grades o meu pequeno território. Andava por todo o lado com esse equipamento, insinuando entre mim e os outros uma distância. Instalado numa gaiola de vidro, deitado no interior de uma garrafa, sentado numa cadeira de rodas, punha em evidência a fragilidade que a doença me depositara nos ossos como uma marca trémula. Não podia ser alcançado. As mãos que se estendiam para mim tinham de atravessar vidros. Por vezes feriam-se. Apenas o vento forte me abalava, derrubava a gaiola e partia os vidros que eu não voltava a colocar. Deixava assim que corpos se aproximassem; era incapaz de os avisar. Eles é que deviam adivinhar o obstáculo. Vinham e, mesmo feridos, ficavam ao pé de mim."

"Há quem escreva com medo de enlouquecer, outros porque não sabem fazer mais nada, porque não podem deixar de o fazer, alguns por dever de ilusão ou de vaidade, outros, finalmente, para troçarem da morte e fazerem filhos nas costas do tempo. Tu escreves para deixar de aparecer."

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