Ignacio Martínez de Pisón | A Hora da Morte dos Pássaros
"Lembro-me daqueles Verões como se não houvesse tempo para o aborrecimento. Suponho que houve momentos, muitos momentos, em que a solidão se tornava entediante, mas a minha memória ou se recusou então a registar esse tédio ou se recusa agora a recordá-lo. Na realidade, o facto de qualquer novidade, por pequena que fosse, se converter para mim num grande acontecimento é bastante significativo. Mas nenhuma delas era tão importante para mim como a chegada de Alicia e do tio Luis.
Costumavam chegar em meados de Agosto. (...) Era completamente diferente de todos os adultos que eu conhecia. Teria então uns quarenta anos, talvez mais, e no entanto não se comportava connosco como a maioria das pessoas da sua idade, que faziam sempre a mesma coisa: dar-nos uma palmadinha carinhosa na cabeça, perguntar-nos o que queríamos ser quando fôssemos grandes, e depois conversar durante horas com a minha mãe como se nós não existíssemos. Ele não, ele falava de coisas que percebíamos e que nos interessavam, e isso fazia-nos sentir que a nossa companhia não o estorvava. Tinha viajado por meio mundo e tinha sempre histórias e coisas curiosas para contar. (...) Na altura a única coisa que nos importava, ao meu irmão e a mim, era estar com ele, não desperdiçar nem um único desses minutos. Tenho a certeza de que Javier pensava o mesmo que eu, que oxalá o nosso pai tivesse sido como ele, que oxalá o tio Luis tivesse sido o nosso pai."
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