Italo Calvino | Um Eremita Em Paris
"Talvez para compreender quem sou tenha de observar de um ponto do qual poderia estar e não estar. Como um velho fotógrafo que se põe em pose diante da objectiva e corre depois a carregar no botão, fotografando o ponto onde podia estar e não está. Se calhar é deste modo que os mortos olham os vivos, misturando interesse e incompreensão. Mas isto penso-o quando estou deprimido. Nos momentos eufóricos penso que esse vazio que não ocupo poderá ser preenchido por um outro eu próprio, que faz as coisas que eu deveria ter feito e não soube fazer. Um eu próprio que só daquele vazio poderá brotar."
Comentários
Há em cada instante uma noite sacrificada
ao pavor e à alegria.
Embatente com suas morosas trevas.
Desde o princípio, uma onde que se abre
no corpo, degraus e degraus de uma onda.
E alaga as mãos que brilham e brilham.
Digo que amaria o interior da minha canção,
seus tubos de som quente e soturno.
Há uma roda de dedos no ar.
A língua flamejante.
Noite, uma inextinguível
inexprimível
noite. Uma noite máxima pelo pensamento.
Pela voz entre as águas tão verdes do sono.
Antiguidade que se transfigura, ladeada
por gestos ocupados no lume.
E novos "eus" nascem.
li algures que o nosso interior tem mais lugares que uma casa de putas.
tudo muda à medida que os vamos descobrindo.
um beijinho, querida rosa.