Robert Walser | Os Irmãos Tanner



"Sempre tive o costume de te tratar como se fosses inferior a mim. Talvez outras pessoas façam o mesmo. Só quem te conhece achará que és capaz de sentimentos profundos e pensamentos arrojados, os outros não. Esta é a causa e a essência do teu provável falhanço na vida: para acreditar em ti, é preciso conhecer-te, e para isso é preciso tempo. A primeira impressão, aquela que decide o sucesso, ser-te-á sempre desfavorável. Poucas pessoas te amarão, mas entre elas estarão algumas que esperarão tudo de ti. Serão pessoas a quem tu agradarás, pois a tua estupidez pode levar-te longe.
Num círculo maior de gente, onde seja necessário que cada um se torne visível e respeitável através da eloquência, tu permanecerás sempre mudo, porque não terás vontade de abrir a boca onde todos tagarelam. Por esta razão, serás ignorado, o que despertará em ti uma conduta inconveniente e obstinada.
Para quem te conhece será um privilégio manter uma conversa cordial contigo, porque tu sabes escutar, e numa conversa saber escutar é talvez mais importante que falar. Haverá quem goste de confiar os seus segredos e vicissitudes da alma a uma pessoa calada como tu, e tu revelarás a tua mestria no silêncio e na expressão discreta. És um tanto pesado a falar. Para a maior parte das pessoas, serás um fenómeno desinteressante. Faz o que puderes para te corrigires neste aspecto!

É salutar admitir a minha fraqueza, após meses de silêncio torturante que exigem uma força que não tenho. Tenho de procurar uma nova vida, mesmo que a minha vida inteira venha a ser apenas a busca de uma nova vida."

Comentários

rosa disse…
Uma pessoa imagina que a amizade é um serviço. O amigo, assim como o namorado, não espera recompensa pelos seus sentimentos. Não quer contrapartidas, não considera a pessoa que escolheu para ser seu amigo como uma criatura irreal, conhece os seus defeitos e assim o aceita, com todas as suas consequências. Isso seria o ideal. E na verdade, vale a pena viver, ser homem, sem esse ideal? E se um amigo falha, porque não é um verdadeiro amigo, podemos acusá-lo, culpando o seu carácter, a sua fraqueza? Quanto vale aquela amizade, em que só amamos o outro pela sua virtude, fidelidade e perseverança? Quanto vale qualquer afecto que espera recompensa? Não seria nosso dever aceitar o amigo infiel da mesma maneira que o amigo abnegado e fiel? Não seria isso o verdadeiro conteúdo de todas as relações humanas, esse altruísmo que não quer nada e não espera nada, absolutamente nada do outro? E quanto mais dá, menos espera em troca? (…)

Sándor Márai
duda disse…
parabens pelo blog. sou viciada em leitura e, como tal, gosto sempre de vir aqui dar uma olhadela=)
imo disse…
amamos quando vemos o outro por inteiro. senão, amamos no outro apenas o que nele vemos de nós próprios.

sempre luminosa, rosa.
imo disse…
sê bem-vinda, duda.
desejo-te boas viagens.
rosa disse…
sabia que hoje vinhas cá...


"dizem que vive na transparência do sonho
à beira-mar envelheceu vagarosamente
sem que nenhuma ternura nenhuma alegria
nunhum ofício cantante
o tenha convencido a permanecer entre os vivos"

AB
imo disse…
"... mas ao anoitecer adquire nome de ilha ou de vulcão.
e na fria lava da noite ensina ao corpo
a paciência o amor o abandono das palavras
o silêncio
e a difícil arte da melancolia."

hoje; mais do que apenas mais um dia.
(in)tacto disse…
:)
beijinho
imo disse…
Mil e um beijinhos